Friday, February 27, 2009

Tu e as Magnólias



Acordo e não estás… mas está o teu pijama… com o teu cheiro.
E mais uma vez acordo apaixonada por ti como acordarei para sempre com a certeza de que não me vou fartar.
Está sol e um dia lindo e a consciência do trabalho obriga-me a ir ao centro da cidade.
Entre arranjar o cabelo num cabeleireiro minúsculo com um tecto fantasticamente trabalhado num primeiro andar da praça de Carlos Alberto e o ir ver doentes que operei ontem, passeei-me na calçada portuguesa com uma luz linda… algo ofuscante… que contraria as noticias dos senhores do tempo e as tristezas do Mundo inteiro.
O meu cabelo está lindo e os doentes estão bem.
Caminho então com ainda mais segurança, com um sorriso de orgulho de mim para mim, apaixonada pelo Deus que nos juntou.

É essa calma e serenidade que me mostram as magnólias em flor.
Do pouco que percebo de flores… mas do que observo… tenho reparado que a primavera chega repleta de magnólias em árvores que durante o Inverno ninguém daria nada por elas. Há outras também… mas estas são especiais… pelo imagem fantástica do filme dos sapos que caiem dos céus. E lá estão elas, cheias e imponentes, à espera de sapos caídos do céu…. que verdadeiramente acredito ser possível.

Ando pela rua feliz de pescoço erguido como uma girafa e quando me perguntam por ti, apanham-me a pensar em ti… e o meu sorriso deve dizer mais do que eu própria.
E sinto uma cumplicidade imensa com a Primavera. Sorrio para estas árvores que alguém como eu as pôs no meio da cidade… à espera que alguém como nós sorria para elas para lhes dar coragem para crescer.

O dia ainda vai longo, mas mais logo vamos estar juntos.
Vou-te comprar uma prenda por seres quem és, comprar flores, acender velas e fazer o teu jantar preferido. Vou vestir a minha melhor lingerie e o meu melhor vestido. E quando chegares abraço-te como se fosse a primeira vez.

Saturday, February 21, 2009

Som



Vi um filme sem música, sem palavras, sem banda sonora.
Uma co-produção franco-país qualquer de leste...talvez polaca.
Isto tudo no tempo em que os cinemas se restringiam a lugares próprios de nome próprio. Não na transição dos centros comerciais, que propositadamente escrevo de letra minúscula… não no fim da sua sobrevivência… mas no seu auge de Casas de Cinema independentes.
É estranhamente curioso como me lembro hoje desse filme ausente de estímulos musicais. O único que vi desse género… não imaginando que tenham sobrevivido muitos neste Mundo e no Mundo dessa altura, não tão distante assim.
Casa das Artes, numa cadeira horrivelmente desconfortável, frio… mas numa rua bonita e com fama de filmes de qualidade. Moda da altura os mais estranhos filmes europeus… moda essa que quase aniquilou este género de produções por só apresentarem as mais esotéricas esquecendo a verdadeira qualidade dos filmes europeus.
Houve uma insistência minha para ficar mais um pouco. Para continuar a acreditar que as imagens dos 3 personagens que se moviam lentamente, num sítio já lento por si, sem qualquer interacção… para continuar a acreditar num contexto que nenhum dos intervenientes dessa produção tinha qualquer intenção.
No imenso silêncio desse filme, responsável pela minha memória de hoje, a minha respiração ausente de entraves respiratórios, confundia-se com a respiração deles, os no máximo 3 personagens.
Quando um deles acendeu um cigarro, foi um ruído enorme que me acordou. Não que estivesse adormecida de sono ou desinteresse… mas sim de estímulos.
Foi como o som de uma bomba que me deu a esperança de esperar mais umas parelhas de dez minutos… pelo som…
Frustradamente abandonei a cadeira incómoda, o frio. Irritada pelo abandono que as minhas emoções regentes do momento tenham impedido a minha inteligência própria de descortinar o sentido… do filme sem som.
Não sei o nome… do filme. Mas lembro-me dele.
E os sons… tornaram-se ainda mais importantes nesta minha estadia pela vida.
Talvez por esse filme ou talvez não. Talvez ele seja só um exemplo.
Gostava de me lembrar do nome para poder dele falar a alguém entendido e poder ter alguma explicação.
Mas satisfaz-me de alguma forma saber que me relembra a importância do que ouço.

O Japão, eu e tu



O Japão não é uma solidão de turista.
É um sonho de banda desenhada e de uma modernidade desconhecida. Da única para além desta a que chamamos Europa.
É um sonho só a ideia de ir…

E a chegada é a transposição para um outro Mundo, um mundo que está quase saído do nosso mapa da escola. Não tem nada a ver com a magia mística da Índia ou a neblina do passado de Angkor, nem com a chegada de madrugada a Machu Pichu.

É a porta de entrada no Novo Mundo… o paralelo ao nosso… que dizem ser parecido mas que não tem nada a ver… é como vermo-nos 20 anos à frente… e gostarmos do que vemos. Onde as pombas foram substituídas por corvos e onde os néons com dragões que se passeiam ultrapassam qualquer reclame de” boca-doce” ou de um qualquer detergente barato de marca branca.

O Mundo dos néons e da electrónica silenciosa, dos livros de quadradinhos forrados a papel que se lêem de trás para a frente e que têm prateleiras só para pornografia que me arrependo para sempre de não ter comprado. Onde Manga reina mais do que Ferrari e o karaoke ultrapassa qualquer noite de São João.

Onde as tantas luzes nos fazem sentir muito pequeninos. Onde a noite são só luzes que cintilam e ganham vida própria.
Onde o metro é estranho mas demasiado simpático para ser difícil. Onde qualquer japonês nos ajuda a pôr o dedo no mapa. Onde os nosso olhos não repousam pela curiosidade…. nem os deles… e quem mais estranha quem, é difícil dizer…

O país dos néons modernos, do Manga e das marcas. Dos japoneses bonitos e das japonesas que retocam a maquillagem em qualquer esquina, mesmo sem precisarem de realçarem os olhos perfeitos que nos fazem sentir inveja de os termos tão grandes.

Não vi Tokyo de um 50 andar… mas sentei-me várias vezes em Shibuya crossing...
como numa réplica do Lost in Translation…à espera de um dinossauro electrónico que nunca passou… ou que eu não vi tão absorvida pela excentricidade da juventude japonesa a atropelar-se nas zebras desenhadas no chão que se não se vêem do céu é porque é um erro dos deuses.

Ou quando te vi passar a porta do templo dos casamentos…. Que por azar nesse dia não existiam…casamentos. Mas que obviamente os vi de olhos fechados… e quase os senti quando senti a tua mão no meu braço. E a tua baralhação com o grupo de deficientes que não distinguiste de gente sana… só porque eram de uma outra raça a que pouco estamos habituados.

Tenho que admitir que me desiludi com os restos infindos do bairro das gueixas em Kyoto. Precisei fechar os olhos para ver os meus filmes de sempre. E precisei abrir os olhos para ver o que nos aconteceu. Para as ver as gueixas fugitivas… e a nós fugitivos.

Foi uma terra estranha Kyoto… demasiado cidade para tanto templo Zen e tanta história de gueixa… que existem… mas esquivas aos ataques desta nova sociedade que as vê como aves em extinção.

Foi estranho dizer-te que te amava em japonês e foi estranho acordar a amar-te sem certezas de tanta confusão, num Mundo tão confuso por tão longínquo ser. Fazia 35 anos quando acordei a ouvir a música que fizeste para mim.

Levei-te ao templo mais bonito. Um Buda Zen de pedra maciça repousava entre as montanhas, mais sereno que qualquer um de nós os dois nesse 26 de Abril.

Atravessamos parte do Japão no comboio… só porque era famoso e eu queria andar nele…. e adormecemos de cansaço ao passar pelo Mt Fuji… ou não o vi porque chorei ou porque estava na janela do outro lado.

E o meu Mundo cheio de Japão e Kyoto e budismo Zen e de Tokyo e cerejeiras que por sorte estavam em flor, e cheio de amor para quem viesse enviado dos céus… absorvi o Happy de uma forma desvastadora.

Atravessei o tal de Japão nesse tal de comboio bala com lágrimas mais lentas que a paisagem. Fechava os olhos e via a noite, os corvos e as luzes e não acreditava que o monte Fuji estava à minha direita.

Nem quando os monges me acordaram às 5h da manhã eu acreditei.
Nem quando ía para os banhos ao fim do dia e me via demasiado magra.
Nem nunca acreditei.
Viagens são sonhos que não se repetem.

Se agora estás comigo é porque estamos acima dos sonhos e ilusões. Para além do Japão e da Índia, num Mundo onde as cores se sentem e o cheiro se vive.
Onde a minha mão na tua se transforma na simplicidade de um sorriso.

Wednesday, February 11, 2009

Moakys e os monstros


Construiu-se ao longo dos anos.
De tímida, de timidez implacável… a rebelde… só porque a rebeldia significava liberdade… libertação…de ela própria.
De excessos a ponderação. Ao longo de anos… bastantes. Excesso de excessos, a excessos de ponderações.
Uma luta interior com o monstro timidez de olhos negros e grandes… para com a serenidade do não precisar de chamar a atenção.
Levou tempo… ajudado por um orgulho interior demasiado grande… que neste caso contrabalançou.
Exemplo do seu pensamento dia qualquer coisa há uns anos na Ásia, primeira viagem sozinha com demasiado tempo para se conhecer. Talvez um dia ela o conte por palavras… talvez distorcidas já pelo tempo… mas sempre algo reais no que ela é.

Um texto sobre maturidade impressionou-a… teria uns vinte e qualquer coisa anos… sentia-se a meio caminho… e sentia a tal de maturidade como um néctar de serenidade interior. Tentou segui-lo… ao texto… não teria mais que 4 linhas.
Talvez a tenha atingido quando deixou de procurar… a maturidade.

Agora diz-me ser todos. Os monstros com quem agora se ri em conjunto passaram a ter olhos verdes e a menina tímida a quem sussurra para ser corajosa sorri-lhe todos os dias. Uma misturada de muito mais que a faz feliz por não ser um ícone.
Segundo o texto, já a devia ter atingido… a maturidade.
Mas fico feliz por vê-la com réstias de rebeldia e cheia de interesses de persegue, quais sonhos, e serena e demasiado ponderada… ou responsável e alheada… seria a combinação quase perfeita.

Mesmo sentindo que o final é isso… a maturidade do texto de 4 linhas… e que até pode ser bom… se o passado permanecer presente como parte da história, mesmo com todos os seus erros… então volto-lhe a falar nisso.

Ardhanarishwara



É um objecto caro o pequeno coliseu sofisticado em forma de folha de lótus, o mais caro. Mas é o que em conjunto com as bolas de natal cor de laranja mais brilha.

Reflecte a inconstância da luz das velas. Estas estão altas e são compridas, prolongam a beleza de castiçais de prata do século passado, uma prenda da minha mãe.

Tudo sobre panos amarelos e vermelhos e alanranjados com dizeres em sânscrito.

Ardhanarishwara é a quem rezo, é quem repousa no coliseu. Pedra sabão cinzenta que de perto tem umas fugazes tonalidades rosa, que eu pensava ser mármore de Varanasi. Shiva e Parvati como um só, em plena harmonia. Traços bem defenidos, de frente e verso.

Rodeiam-na, à estátua, os deuses da Trimutri e suas consortes e alguns ganeshas. Um Buda para defender os dizeres do pano budista amarelo. Minúsculos, de cobre, que só com atenção se identificam. E flores Hindus laranjas vindas de Delhi e já secas mas ainda laranjas.

O potezinho cor de bronze, não muito bonito, com água do Ganges representa o elemento água, ou o Ganges amparado pela cabeça de Shiva, ou Varanasi, ou apenas mais uma oferenda sagrada.

Mas é um templo completo.

Os postais com rebordos prateados, a rondar o piroso, imagens de Ganesh e da família de Shiva e Parvati e as pedras da minha astrologia, mais a do amor, em veneração a Ardhanarishwara. A pulseira do Ganeshinha benzida no templo Dourando e medalhas e moedas hindus. Uma latinha de kajel para o proteger, ao Ganeshinha. Um lingam claro, que devia estar coberto de leite. E obviamente arroz.
A rudraksha de Shiva e Parvati, a das duas faces, a do amor, e uma embalagem de papel revestido de plástico transparente, por ainda não estar aberta, com o pó vermelho para o Tilak.

Podia ter mais e mais, mas perderia o equilibrio
Um templo ao amor.