SEM IMAGEM
Sintonia é uma palavra quase impossível.
O momento certo. Mas são tantos os momentos nas nossas vidas… que alguns nos passam ao lado sem sequer neles reparar-mos.
Mesmo quando achamos que o nosso amor é enorme e parece cobrir o Mundo… não chega.
É como um rádio preto com uma antena que se desdobra e tem um ponteiro vermelho que se mexe demasiado depressa entre números aleatórios, embora os nossos dedos tentem virar o botão muito devagarinho. Muitas vezes esse ponteiro vermelho atravessa de trás para a frente sem nunca conseguir sintonizar. Queremos mesmo que ele pare, mas para ele, o ponteiro vermelho, é-lhe indiferente. Não quer saber do botão preto que está oposto à antena e que tentamos orientar para todos os nortes e que acaba meio torcida (a antena) sem nos aperceber-mos de como a estragamos. E voltamos a dobra-la para a endireitar numa tentativa de começar tudo de novo… mas ela vai-se fragilizando e um dia acabará por partir. Ou o botão desligar-se-á do ponteiro por teimosia e rodará sem o outro se mexer. O rádio, esse manter-se-á sempre como tudo o que é antigo e funcionará noutros tempos em que já não existirão rádios pretos. Mas já sem sintonia… Ou haverá esse momento certo e tão ínfimo e tão raro, em que ao ligar-mos esse aparelho agora bizarro, ele por mero acaso, está sintonizado. Esse fenómeno deixaria qualquer um feliz. Ou a nós os dois, porque estaríamos juntos.
Sintonia é estranhamente difícil.
São dois corações que têm que palpitar ao mesmo tempo.
São dois olhos que têm de brilhar ao mesmo tempo.
São dois corpos que estremecem quando se encostam desprevenidos.
Sorrisos que se contagiam por um reflexo instantâneo.
Risos sentidos por simplicidades alheias.
Sintonia não é uma palavra de outro mundo.
Surge, quando surge, e surge sempre.
O amor não se contagia, nem se conquista. Nem que o achemos de uma grandeza inegualável.
Surge como uma sintonia inesperada.
